domingo, 27 de junho de 2010

Amor de fã

Você passaria a madrugada em frente ao prédio do seu namorado, esperando ele abanar da janela? Você escreveria para seu marido um bilhete com dois quilômetros de comprimento, escrito de ponta a ponta '' te amo, te amo , te amo, te amo'' ? Você arrancaria um pedaço da camiseta dele com os dentes, choraria convulsivamente ao vê-lo sorrir, passaria fome e frio em troca de um rabisco feito por ele? Se ele fosse o Ricky Martin, sim. Mulher nenhuma faz pelo Zé que tem em casa o que faz pelo Fábio Assunção, pelo Rodrigo Santoro ou pelo Maurício Mattar. Amor de fã é passional,ardente, insaciável. Elas fazem qualquer coisa por um homem que nunca viram antes, que não sabem se é bom ou mal caráter, se tem calos nos pés ou se limpa o nariz na manga da camisa. Apaixonam-se por uma figura idealizada, por um príncipe de faz-de-conta, e assim compensam suas carências. Quando vi milhares de pessoas,mulheres na maioria, fazendo vigília em frente ao hospital onde esteve internado o falecido cantor Leandro, pensei: Será que elas fariam a mesma coisa por um pai, por um irmão, por um marido? Passariam em claro tantas noites, se ajoelhariam na calçada, se desesperariam dessa maneira? Desconfio. O sentimento que temos por nossos familiares é muito mais complexo: são relações de amor e ódio. A convivência humana é implacável. Por mais que amemos quem está próximo de nós, acreditamos que ouvir suas críticas e reclamações, vivenciar sua ironia e descaso, agüentar seus hábitos e manias, tudo isso vale como cota de sacrifício. Em caso de doença, não carece cair de joelhos na calçada, basta rezar uma Ave-Maria em casa. Com nosso ídolo é diferente. Ele é lindo, rico, afetuoso, só tem qualidades. Facilmente o confundiremos com os papéis que representa, com a música que canta. Ele nunca chegou atrasado a um compromisso com você, nunca chutou o seu chão, nunca roncou , nunca a decepcionou, simplismente porque nunca se relacionou com você: é um amor unilateral e fantasioso. Você projeta no seu ídolo as qualidades que você não vê em quem está a seu lado e entra em surto quando tem a chance de receber dele algo real, nem que seja um autógrafo ou um fio de cabelo. Pecado não é, mas quem dorme sob o nosso teto todos os dias deveria merecer, no mínimo, a mesma devoção.